segunda-feira, 10 de agosto de 2009

CONVERSA COM A ESPOSA

Descobri o número do quarto em que o sujeito estava internado. Subi até lá e fiquei esperando sua esposa sair para dar uma volta. Foi então que decidi abordá-la. Eu inventei que era psicólogo do hospital e costumava conversar com familiares de quem havia tentado o suicídio.

- Mas meu marido não tentou se matar – respondeu, na defensiva.
- Pelo que consta no meu relatório, ele quase cortou o próprio pênis. A senhora tem ideia do porquê dele ter feito isso?
- Juro que não sei. Mas o Roberto andava estranho ultimamente...
- Estranho como?
- Ele queria muito mais sexo que o habitual – disse, constrangida.
- Me explique isso.
- Se antes, eram duas vezes por semana, nos últimos tempos eram várias por dia. E ele não saía de perto de mim. Sempre acariciando, pegando.... enfim, você sabe... Eu sentia que meu marido nunca estava satisfeito.
- E houve alguma razão especial para isso?
- Não que eu lembre. Um belo dia ele, simplesmente, acordou assim.
- E o que seu marido fez no dia anterior?
- Não sei ao certo. Talvez tenha ido ao bar com os amigos, como sempre faz às quartas-feiras.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

NO HOSPITAL

Um bom detetive não é nada se não tiver bons contatos. E eu me orgulho em dizer que tenho gente de confiança em cada delegacia e hospital dessa cidade. No Santa Lúcia não era diferente. Assim que cheguei lá, procurei pelo Antônio Maria, um funcionário administrativo que tinha acesso a todas as fichas de quem entrava e saía dali em internação. E não foi difícil localizar um sujeito que tinha tentado cortar o próprio cacete.

Segundo meu informante, o cara fora operado e estava em observação. A esposa havia dormido no quarto com ele. Eu tinha que falar com essa mulher de qualquer jeito. Eu sentia uma pista importante por ali.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

A NOTÍCIA

Não havia mais novidades nesse caso. Fui dormir frustrado. No dia seguinte, acordei de mau humor e ansioso por uma xícara de café quente. Peguei os jornais do dia para dar uma folheada. Sempre vou primeiro à parte policial. Nada de novo até uma pequena nota no canto da página.

FUNCIONÁRIO PÚBLICO É HOSPITALIZADO APÓS TENTAR CORTAR O PRÓPRIO PÊNIS.

Meu coração pulou. E a porra da notícia não dava muitos detalhes. Apenas que a esposa do sujeito o havia encontrado inconsciente e com o pau pendurado pela metade. Ele não tinha conseguido cortar tudo. O homem estava internado no Hospital Santa Lúcia. Muito estranho. Será que tinha alguma ligação com o meu caso? Peguei minhas coisas e saí para investigar melhor.

terça-feira, 21 de julho de 2009

O ÚLTIMO BAR

Os dois estudantes até que foram bastante receptivos. O que não me surpreendeu. Há muito tempo percebi que as pessoas adoram falar dos mortos, principalmente quando os conheciam intimamente. Gustavo e William me contaram que o falecido era um cara bastante equilibrado e responsável. Estudava muito e gostava de beber cerveja nos fins de semana. Os três sempre saíam juntos. A última vez que se encontraram foi em um conhecido bar aqui em Brasília, chamado Ponto 78.

Depois disso, Paulo não saiu mais de casa. Será que aconteceu algo naquele dia que pudesse ter contribuído com sua morte?

Eles não lembraram de nada anormal, mas pedi que se concentrassem em recordar alguma coisa. Dei meu telefone e tentei justificar tanto interesse da minha parte: a família queria saber se algo estava perturbando o garoto, para entender os motivos do suicídio.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

COLEGAS DE FACULDADE

Saí do apartamento do falecido com a pulga atrás da orelha. O que leva um garoto a se viciar em pornografia daquele jeito? E terminar uma orgia masturbatória se capando? Não faz sentido. Por isso resolvi conhecer um pouco mais sobre o sujeito procurando seus amigos de faculdade. Não foi difícil encontrá-los. Chegando ao curso, vi a foto de Paulo em um mural e uma mensagem de condolências, lamentando seu falecimento. Nenhuma menção ao suposto suicídio.

Perguntei a uma garota que passava quem eram os melhores amigos do morto, pois eu era próximo à família e queria ter mais notícias. Logo ela me indicou dois rapazes, chamados Gustavo e William. Esperei a aula em que estavam terminar para tentar uma aproximação. Logo reconheci Gustavo pela descrição da colega: alto, magro e óculos de armação grossa. Ao seu lado, o inseparável William, usando boné e camisa de banda de rock. Dois perfeitos estereótipos.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

DENTRO DO APARTAMENTO

Quem mora em apartamento em Brasília sabe: tem uma hora do dia em que os porteiros sempre somem e ninguém sabe para onde vão. Um mistério. Foi em um desses momentos que aproveitei para entrar na prumada e subir até o andar do falecido. Abri a porta com cuidado e entrei depois de me certificar que não havia ninguém por perto.

Á primeira vista, era um imóvel normal de um rapaz solteiro. Uma sala com sofá e TV, uma mesa cheia de papéis, dois quartos (um dormitório e um escritório com computador), um banheiro, cozinha e varanda. A cama estava desarrumada e cheia de roupas espalhadas. Olhei rapidamente nos armários e não encontrei nada suspeito. Segundo o relatório da polícia, Paulo cortou o pau dentro da banheira, jogando o membro perto do vaso sanitário. Ele deitou-se dentro da água morna e ficou ali até morrer. Abri um dos armários do banheiro e vi uma pilha de revistas pornográficas. Totalmente normal para um rapaz nessa idade. Mas o que me chamou a atenção foi que algumas delas sequer tinham sido abertas. Ainda estavam no saco plástico preto em que são vendidas nas bancas de jornal.

Fui até sua estante de DVDs e encontrei muito mais pornografia. É, o garoto gostava mesmo disso. Eu apostaria um milhão de dólares que o computador teria ainda mais putaria. Dito e feito. Muitos gigabytes da mais pura e saudável sacanagem. Não achei nada que lembrasse pedofilia, zoofilia, necrofilia ou qualquer aberração sexual. O menino parecia normal até ali. Mas, quando resolvi acessar seu histórico do navegador de internet para ver os últimos sites visitados, tive a surpresa: Paulo passara seus últimos quatro dias de vida acessando, ininterruptamente, diversas páginas de pornografia.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

OS PORTEIROS SABEM DE TUDO

Tenho que confessar uma coisa: eu não gosto de futebol. Sério. Acho um esporte monótono, sem graça e cheio de gente estúpida. Mas eu leio todos os dias os cadernos esportivos e as colunas futebolísticas. Eu sei tudo sobre os campeonatos estaduais e sobre o Brasileirão. A escalação da Seleção está sempre na ponta da língua. Aí você me pergunta: por quê? Simples. O futebol é o melhor canal de comunicação com porteiros, zeladores, faxineiros, guardadores de carros e profissões desse tipo. E essa gente é a maior fonte de informações que um detetive pode ter. Eu só preciso me aproximar e começar a conversar sobre o jogo da noite passada que eles me abrem o coração. Ah, eu adoro o futebol...

Foi o que eu fiz com o porteiro do finado Paulo. Assim que vi um adesivo do Flamengo grudado no caderno velho onde ele anota as correspondências, perguntei quanto tinha sido o jogo do domingo. E me pus a xingar o técnico do clube, que não escalara jogadores importantes para o clássico contra o Fluminense. Após 15 minutos de conversa, perguntei se havia algum apartamento para alugar naquele edifício. E se a vizinhança era tranquila. Tinha algum universitário por ali? Eles costumam fazer festas barulhentas...

Logo o porteiro soltou a língua. E falou sobre um rapaz que tinha se matado. Ele morava sozinho e estava há quatro dias sem sair do apartamento. Até que sua mãe chamou a polícia e arrombaram a porta. Uma tragédia.

- Ele tinha muitos amigos? Havia dois colegas de faculdade que apareciam com certa frequência.
- Tinha namorada? Nunca vi.
- Incomodava os vizinhos de alguma maneira? O rapaz era silencioso e educado com todos.
- Por que será que ele se matou? Talvez ele estivesse com saudade dos pais, né?

terça-feira, 30 de junho de 2009

O INÍCIO DA INVESTIGAÇÃO

Antes de começar uma investigação, é preciso traçar um objetivo para ela. E eu não tinha essa meta ainda muito clara. A polícia atestou o suicídio do rapaz, mas eu precisava confirmar isso. Porque sempre há a possibilidade deles terem errado. O primeiro passo, então, era ir ao local do acontecido. Marta me deu as chaves do apartamento do filho para que eu tivesse total liberdade de ação. E ela estava tão certa de que eu acharia alguma coisa suspeita, que pouco alterou o imóvel após a morte. Só limpou o sangue do banheiro. O resto continuava do mesmo jeito desde o fatídico dia. Também tive acesso às contas de luz e telefone, que ela mesma pagava.

Tentei conseguir informações mais pessoais sobre o garoto, mas acho que uma mãe que mora longe seria a pessoa menos indicada para fornecê-las. Mesmo assim, perguntei:
- Ele tinha namorada? Não.
- Usava drogas? Claro que não!
- Já tinha entrado em depressão? Não.
- Tomava remédios controlados? Não.
- Tinha inimigos? Provavelmente não.

Segundo ela, Paulo era um menino doce e simpático, muito estudioso e querido por todos. Mas eu teria que confirmar tudo isso. Peguei meu carro e fui até seu apartamento, na Asa Sul.

CASO ACEITO

Acho que não deve ser uma notícia muito agradável de se receber. Saber que o próprio filho cortou o pau com uma faca de cozinha. Eu até entendo a incredulidade da minha cliente. A polícia atestou o suicídio baseada em evidências claras, mas a mãe duvidava disso e contratou um detetive particular para investigar o caso. Foi aí que eu entrei na história. Confesso que não era um serviço muito usual. Afinal de contas, não havia suspeitos, nem indícios que levassem a crer que o garoto não se matara realmente. Era apenas o desespero da mãe em tentar conviver com aquele fato pelo resto da vida. Aceitei o caso e marquei um novo encontro com Marta dali a cinco dias, para dar o meu parecer sobre a investigação.

O MISTERIOSO SUICÍDIO

Marcamos o encontro em um restaurante discreto na Asa Norte. Marta chegou no horário marcado, usando um vestido marrom com gola rolê que contrastava com o calor que fazia naquele dia. Ela não tirou os óculos escuros durante toda a conversa. Eu a cumprimentei da forma mais simpática que pude, mas não consegui arrancar nenhum sorriso de simpatia. Ao chegar, coloquei meu inseparável gravador na mesa e perguntei se haveria problemas em registrar o que falávamos. Ela balançou a cabeça negativamente. Pediu um suco de laranja e me contou sua história.

Vou fazer um resumo pra vocês: Marta é viúva e morava em Brasília com seu único filho, um rapaz de 20 anos, chamado Paulo. Ela, que é funcionária pública, foi transferida para Santa Catarina e deixou o garoto morando sozinho aqui, pois ele não queria largar a faculdade. Isso já tem quase um ano. Há cerca de uma semana, aconteceu a tragédia. Paulo foi encontrado morto em seu apartamento na Asa Sul. A mãe voltou para Brasília desesperada, querendo saber o que havia acontecido. A polícia informou que foi suicídio. A mulher não acreditou, pois conhecia o filho e ele nunca tivera o perfil suicida. Mas a perícia confirmou. O rapaz se matou. O mais chocante, porém, foi a causa mortis. Hemorragia. Paulo cortou o próprio pênis e sangrou até morrer.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

UMA CLIENTE NA SEGUNDA-FEIRA

Antes do celular, tudo era mais difícil. Eu tinha que ficar plantado no meu escritório, ao lado do telefone, à espera da ligação dos clientes. Mesmo com a possibilidade de deixarem recados na secretária eletrônica, muitos deles se envergonhavam e desligavam o aparelho antes de qualquer mensagem. Agora, tudo mudou. Qualquer um pode me ligar a qualquer hora. Meus números estão na internet e nas Páginas Amarelas. Meu e-mail também. É moleza entrar em contato.
E, em meio àquela tarde quente de segunda-feira, recebi a ligação de uma mulher chamada Marta. Ela queria encontrar-se comigo no dia seguinte. Pedia que eu descobrisse algo muito importante para ela. Logo imaginei o que seria: a amante do marido. Geralmente é isso. E já fiquei feliz, pois esse é um dos serviços mais fáceis de serem feitos.

Basta seguir o sujeito por sete dias e pronto. A maioria desses caras encontra a amante uma vez por semana. Quando ele já não tem um apartamento montado pra isso, procura algum motel distante. A vantagem de Brasília é que todos os motéis são distantes. Mas isso não dificulta meu trabalho. Pois, aqui, os motéis ficam todos juntos. Então eu sempre sei a direção que o suspeito segue. Aí tudo fica fácil. Monto uma tocaia e fotografo o casal dentro do carro. Sigo a mulher e faço uma ficha completa de sua vida. Onde trabalha, com quem mora, o que faz para se divertir. E entrego para a minha cliente. Era isso o que eu esperava com a tal Marta. Um simples caso de traição.

Se eu soubesse o que me aguardava, jamais teria atendido o celular naquela segunda-feira.

domingo, 28 de junho de 2009

APRESENTANDO: SAULO ROCHA

Todo mundo quer saber alguma coisa sobre a vida dos outros. Às vezes, uma simples lida em uma revista de fofocas resolve a curiosidade. Outras, quando o interesse é por alguém mais próximo, a bisbilhotice vai mais fundo. Vale uma espiada por cima do muro do vizinho, uma olhadela pelo buraco da fechadura ou uma remexida na bolsa alheia. Mas, quando o caso é mais profundo ainda (e, quando eu falo em profundidade, leia-se sexo e/ou dinheiro), aí as pessoas me procuram. Um detetive particular profissional, especialista em investigar a intimidade de terceiros. Em saber se o marido ou esposa está traindo, se algum funcionário da empresa está roubando, se o filho usa drogas ou é veado...

Enfim, eu sou o cara que descobre os podres. Aquele profissional que recebe pelas más notícias. Ou pelo alívio das suspeitas serem infundadas. Meu nome é Saulo Rocha. Eu moro em Brasília. A cidade do pecado. O antro das intrigas e traições. Aqui, minha clientela é sempre vasta. Políticos, empresários, artistas e todo o tipo de gente disposta a pagar por uma informação valiosa. E, assim, eu vou ganhando a vida.